Conheça as principais características do boi Angus
Reunimos informações da sua origem fora do Brasil e do seu comportamento. Saiba mais sobre a raça taurina que mais vende sêmen no Brasil
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O destaque da atividade agropecuária do Brasil está diretamente relacionado à introdução das raças zebuínas, especialmente o Nelore, que atenderam às expectativas e demandas dos mercados interno e externo. Mas, como o mercado da pecuária brasileira é dinâmico, fatores como a intensificação de práticas sustentáveis, o avançar das tecnologias de nutrição, de manejo, a seleção genética e, ainda, a formação dos preços e a percepção do consumidor causaram intensas mudanças no setor nos últimos anos.
Um exemplo foi a ascensão de uma raça europeia tanto no rebanho quanto no mercado brasileiro – a Aberdeen Angus –, que também passou a ter protagonismo no cenário e ficou conhecida pelo consumidor, difundindo a marca Angus no varejo, principalmente desde 2013 com o lançamento do Programa Carne Angus Certificada. Enquanto o Nelore é altamente adaptado ao clima tropical e aos ectoparasitas, sendo a principal raça no Brasil, o Angus, originário da Europa, prefere climas mais frios e não é tão resistente a essas condições.
Parte de um movimento do mercado, frigoríficos passaram a buscar uma maneira de agregar valor, diferenciando o produto com cortes especiais e foco em qualidade. E nos quesitos maciez e marmoreio, foi a raça popularmente chamada de Angus que ganhou espaço rapidamente no cardápio nacional, virando uma “carne premium”. Consequentemente, ganhou espaço também no rebanho do pecuarista.
Segundo a Associação Brasileira de Angus e Ultrablack, a carne Angus do Brasil é reconhecida hoje como uma das melhores do mundo. Nos últimos anos, cortes produzidos aqui venceram importantes disputas internacionais de qualidade. Seu padrão diferenciado também atraiu compradores internacionais. Nesse cenário, surgiu a Carne Angus Brasileira que associa as qualidades da pecuária brasileira, do processo produtivo e da força genética Angus.
Mateus Pivato, diretor-executivo da Associação Brasileira de Angus e Ultrablack, destaca que o sucesso da raça se deve à sua principal característica, de pelagem curta e de cor preta ou vermelha: a produção de carne de qualidade. “O Angus produz uma carne que tem uma boa gordura entremeada às fibras musculares. É o famoso marmoreio que, inclusive, tem uma composição de ácidos graxos muito parecida com a dos peixes. É diferente daquela gordura subcutânea, daquela gordura que fica sobre o músculo (aquela capa da picanha, por exemplo). Uma das características que fez com que ela se destacasse em todo o mundo, no quesito qualidade”, afirma.
Além disso, segundo ele, a excelência da raça vem de outras características produtivas muito importantes como a facilidade de parto no seu DNA. “Não tem problema na parição, desde que utilizada a genética correta, de trancar os seus bezerros, há uma excelente habilidade materna. As fêmeas têm muita produção de leite, então desmamam terneiros pesados. Também tem a questão da precocidade reprodutiva. São fêmeas que, em ambiente apropriado, conseguem entrar em reprodução em idades bastante jovens. E quanto antes uma fêmea entra em reprodução, antes ela tem seu primeiro terneiro”, explica.
Outro ponto é a precocidade de crescimento, pois são animais que nascem de tamanho moderado e crescem muito rapidamente. O diretor destaca a “facilidade da raça em depositar gordura na carcaça, e também a questão da produção de marmoreio. Mas, principalmente, a deposição de gordura na carcaça, que é essencial quando se fala em produção de carne de qualidade, uma boa cobertura de gordura”.
O Angus é raça cosmopolita, sendo a principal raça taurina criada no mundo. “Sua diversidade genética é ótima, o que significa que existem animais que se adaptam aos mais diferentes sistemas de produção. Desde sistemas mais extensivos, pastoris, até sistemas mais intensivos, em confinamento, em que as linhagens genéticas que devem ser utilizadas são diferentes. Não é à toa que, com essa rusticidade, se produz Angus em tantos lugares pelo mundo”, indica Mateus Pivato.
Sua origem está na Escócia, oriunda de uma linhagem de bovinos mochos do condado de Aberdeen e outra do condado de Angus. O primeiro registro é de 1862 e, depois disso, a genética se espalhou pelo mundo: Nova Zelândia, Austrália, Europa, Canadá e Estados Unidos. Neste último, o primeiro registro foi em 1873 e por lá se tornou a principal raça de corte produzida, onde há a maior “quantidade demográfica”. Sendo assim, Angus hoje é a principal raça criada nos Estados Unidos, país com a maior produção de carne do mundo, e onde há o maior número de exemplares puros da raça. A criação de Angus se difundiu também pela América do Sul, principalmente na Argentina, no Uruguai e no Brasil.
A raça chegou em nosso país pela Região Sul, por meio de animais importados no começo do século passado. O primeiro registro foi realizado em 1º de setembro de 1906, pelo criador Leonardo Collares Sobrinho, de Bagé, cidade do Rio Grande do Sul. Ele adquiriu o animal do criador uruguaio Felix Buxareo y Oribe, um touro de pelagem preta de cinco anos chamado Menelik. Depois houve grandes importações oriundas da Argentina, do Uruguai, da Escócia e dos Estados Unidos, o que fez com que se formasse o rebanho Angus brasileiro de hoje.
Em 1937 já eram 306 animais Angus cadastrados no Brasil, número que chegou a 1.362 em 1963, ano de fundação da Associação Brasileira de Angus. A entidade surgiu da união de um grupo de jovens pecuaristas da região de Uruguaiana, no Pampa gaúcho, que compartilhavam a convicção da revolução que a raça poderia trazer à pecuária nacional.
Eles deram início a um movimento, de mansinho, cativando interessados em povoar os campos com a raça europeia. Primeiro pelo Sul, depois avançou pelo Sudeste e Centro-Oeste, chegando ao Norte e Nordeste. Ao longo de 110 anos de história, romperam as fronteiras do Rio Grande do Sul e, em 2022, a raça alcançou a marca de estar presente em 100% do país, ou seja, está em todos os 27 estados.
“Esse trabalho veio dos selecionadores da Associação Brasileira de Angus, bem como dos programas de melhoramento como o PROMEBO, criado em 1974 no mesmo local onde foi feito o primeiro registro genealógico na Associação Nacional de Criadores Herdbook Colares. Juntas, fizeram com que a raça seja o que é hoje: a principal raça de escolha para a produção de carne de qualidade aqui no Brasil”, destaca o diretor-executivo da Associação Brasileira de Angus e Ultrablack.
A entidade conta com corpo técnico nas cinco regiões do país e destaca ainda o Programa Carne Angus Certificada que, atualmente, é o maior programa de certificação de qualidade de raça no Brasil, baseado em programas que já existiam em outros países, sendo o precursor nos Estados Unidos com o Certify Angus Beef, em 1978. Tal movimento levou a carne Angus a ser considerada a melhor e ganhar espaço de marca de qualidade. A certificação do programa garante todo o processo de seleção genética e dá segurança para o consumidor, pois garante a procedência. Lembrando que a seleção genética, neste caso, prioriza animais com maior marmoreio, maior precocidade, maior área de olho de lombo (tamanho do contrafilé), não só buscando melhor qualidade, mas maior rendimento na produção de carne.
O mercado de genética bovina brasileira está em plena ascensão, com destaque para o crescimento expressivo das exportações de sêmen. Conforme o relatório INDEX da Associação Brasileira de Inseminação Artificial (Asbia), as vendas externas de doses de sêmen bovino aumentaram 19% no primeiro semestre de 2024, em comparação ao mesmo período de 2023. Além do aumento nas exportações, houve um crescimento de 5% na coleta de doses de sêmen.
A criação e o desenvolvimento do Angus já está disseminado pelo país afora devido às características da raça já citadas acima, tornando-a mais escolhida para o cruzamento industrial. Angus é, portanto, a raça taurina que mais vende sêmen no Brasil. Ainda segundo levantamento um pouco mais antigo divulgado pela ASBIA, a comercialização das doses coletadas em território nacional cresceu 23,8% em 2021, ultrapassando a marca das 2 milhões de unidades. Com isso, a produção brasileira no total de sêmen Angus consumido saltou de 24%, em 2020, para 31%, em 2021.
Entre os estados brasileiros, o Mato Grosso lidera como maior comprador de sêmen Angus. Seu uso no cruzamento com animais zebuínos no Brasil central potencializou sua expansão e Mateus Pivato lembra que, “quando a gente fala de Brasil, ainda tem destaque os rebanhos mais ao Sul e Sudeste, cuja produção é de raça pura – Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Minas Gerais. Mas o Angus tem seu grande uso no cruzamento com outras raças, principalmente as zebuínas que são a grande base do rebanho de corte brasileiro - a raça Nelore. Então, além de ser uma raça que, por si só, é extremamente produtiva, o Angus é destaque no cruzamento industrial, pois trabalha com a complementaridade de características”.
Suas origens genéticas são diferentes, ainda que estejam dentro da mesma espécie, mas enquanto o Angus, de origem britânica, é conhecido cientificamente como Bos taurus, o Nelore, de origem indiana, é conhecido como Bos taurus indicus.
O Nelore tem a capacidade de adaptação ao clima tropical, aos ectoparasitas, e é hoje o principal rebanho no Brasil. Já o Angus, de origem europeia, acostumado ao clima frio, busca o gelo. Sem a presença de ectoparasitas, é muito selecionado para produção de carne por ser um animal mais precoce, que tem maior capacidade de posição de gordura intramuscular.
O diretor-executivo da Associação esclarece que existe um pouco mais de dificuldade de produção dele em clima tropical, como raça 100% Angus, mas no cruzamento industrial foi encontrada a complementaridade de ambos. “No Brasil, o cruzamento entre Angus e Nelore resulta no animal chamado 'F1', que combina as melhores características de ambas as raças, como a resistência do Nelore e a qualidade da carne do Angus. São duas grandes raças, sendo que o Nelore é a raça mãe aqui no nosso país, e vai continuar sendo, enquanto o Angus é a principal raça pensada do cruzamento com outras raças, principalmente com Nelore. Quanto trabalhadas, sendo ambas muito bem desenvolvidas pelos seus selecionadores como raça pura, o cruzamento sem dúvida é sempre muito proveitoso”.
Nessa questão, o valor é relativo. No caso dos reprodutores, há valores extremos para os produtores de sêmen que disseminam a genética para todo o Brasil e até para fora. Segundo o especialista, o Brasil exporta sêmen de touros Angus selecionados para alguns países da África, América do Sul e América Central. Os valores são médios de comercialização, nas temporadas de touro, e também para os filhos deles, voltados à produção de carne de qualidade. “O que sempre defendemos, como Associação, é que esse boi, esse novilho, essa novilha, quando produzidos para ingressarem no Programa Carne Angus, que tenham uma bonificação acima da média do preço. Isso é para que o produtor invista na carne, invista na genética Angus e tenha retorno. Para que, além de ter um animal muito bonito na sua produção, ele seja rentável”.
Mateus Pivato lembra ainda da grande diversidade genética produzida no Brasil, das vantagens de nossas proporções continentais com relação aos tipos de sistemas produtivos disponíveis (desde aqueles mais extensivos aos mais intensivos), e da peculiaridade da produção do Angus no Brasil. Para ele há grandes desafios que os pecuaristas enfrentam como a presença do carrapato, temperatura elevada, umidade elevada. “Isso exige uma seleção de animais adaptados à nossa realidade, de pelo curto liso, de boa qualidade de carne, de bons dados de carcaça, ou seja, de bons rendimentos de cortes comerciais. Eu gosto de falar que o Angus nacional é selecionado para sistemas de produção brasileiros, e a gente vem trabalhando muito nesse sentido com os nossos selecionadores, com as nossas pesquisas, mirando nesse Brasil tropical extremamente produtivo. Por isso entra muito bem o cruzamento industrial, e tudo isso a gente tem em casa e pode utilizar para produção”.
Por fim, o diretor-executivo da Associação Brasileira de Angus celebra que o Angus hoje está na mesa do consumidor, está acessível, e é um produto certificado no mercado. “Vários fatores fazem com que a carne Angus seja considerada a melhor, transcendendo a questão da raça e sendo uma marca associada à qualidade. Não tenho dúvida de que esse mercado deve crescer muito nos próximos anos, sabemos da capacidade e da importância do Brasil nesse cenário da produção de proteína de origem bovina”, conclui.