Orçamentação forrageira e a importância para a gestão da propriedade
A hora de planejar o próximo ano é agora.
A hora de planejar o próximo ano é agora.
A pastagem é o maior ativo da pecuária brasileira.
São mais de 160 milhões de hectares com pastagens (Lapig) e cerca de 90% dos animais abatidos no Brasil são oriundos de sistemas de pastagens (IBGE).
Apesar da importância da pastagem no Brasil, não é incomum encontrarmos diversas situações em que há falta ou excesso de pasto para os animais, principalmente acompanhando o período de águas/secas no Brasil Central.
Para uma boa tomada de decisão e programação das atividades porteira adentro, é importante que o pecuarista faça uma boa orçamentação forrageira.
Ela diz respeito a como calcular quanto de forragem será preciso por todo o período de pastejo para que o rebanho possa ter uma alimentação que supra suas exigências, resultando em ganho de peso e menor degradação do pasto.
Antes de mais nada, o pecuarista precisa entender a essência do manejo da pastagem, que visa atingir um balanço harmônico entre os três principais estágios de produção de pastagens: (1) crescimento da pastagem, (2) consumo da forragem pelos animais e (3) qualidade da pastagem, que está relacionada à produção animal resultante.
Veja, a seguir, alguns passos para uma boa orçamentação forrageira.
A quantidade do estoque de forragem disponível é o ponto inicial para definir as projeções do estoque de alimento na propriedade. Esse estoque é a massa de forragem total possível de existir na área. Para este levantamento, podemos adotar um método direto ou indireto.
O método direto é mais trabalhoso, entretanto é o mais exato e permite melhor tomada de decisão.
Para sua definição, realiza-se um corte de amostras da forragem, entre 5 e 25 amostras por piquete, para aumentar a precisão das informações, de preferência ao nível do solo, com área conhecida, normalmente delimitada por uma moldura de metal ou madeira de 1 a 2 m². Veja na figura 1.
Figura 1.
Instrumentos utilizados para amostragem de forragem – moldura de área conhecida, balança portátil e cutelo.Fonte: Embrapa Rondônia
Após cortar toda a forragem dentro da área delimitada, o material coletado deve ser acondicionado em sacos de papel e pesado. A partir da coleta de informações, o produtor pode extrapolar o peso para a área total, em hectares, da sua produção, determinando a quantidade de kg/ha de forragem instantânea do pasto.
Figura 2.
Pesagem do material coletado
Fonte: Embrapa Rondônia
Determinada essa informação, o produtor pode ver quantos pastejos são possíveis, tendo uma projeção, em kg/ha ou toneladas/ha, de todo o período de águas ou período de seca.
Já o método indireto visa amenizar as desvantagens do uso do método direto para avaliação de grandes áreas de pastagens. Em geral, esse método é menos preciso, mas menos trabalhoso.
Podemos citar como métodos indiretos: medida da altura do dossel, estimativa visual e o uso do disco medidor.
Definido o estoque de forragem, o produtor parte para a estimativa de necessidade de forragem dos animais para determinado período.
O entendimento dos níveis produtivos, ou da expectativa de produção do rebanho, para ganho de peso ou para a produção de leite, é fundamental para determinar a demanda por alimento no sistema de produção e no orçamento forrageiro.
Essa variável depende de vários outros fatores, como categoria animal, sexo, qualidade do capim, peso e finalidade da produção.
Nessa etapa, além da matéria seca ingerida, também precisamos considerar a forragem perdida no processo de pastejo, sendo representada pela diferença entre a forragem produzida (acumulada) e a forragem que foi realmente consumida pelos animais.
No planejamento forrageiro, podemos considerar de 60% a 70% de perdas, ou seja, entre 30% e 40% de utilização da forragem. Assim, conseguimos determinar a quantidade de animais que alocaremos em determinada área.
A tabulação e análise das informações fecha o ciclo de etapas do processo de orçamentação forrageiro. Aqui, é possível identificar as épocas de escassez e de excesso de forragem na propriedade, para melhor distribuir o pastejo do rebanho.
Com base nessas informações, as decisões são tomadas para que não falte forragem para o rebanho ao fim de determinado período. Esse processo determinará:
Com base nessas informações, é possível ter uma ideia do custo operacional efetivo e diminuir a necessidade de intervenções. O planejamento, é claro, pode sofrer alterações ligadas ao mercado, mas, se bem trabalhado, garante o sono do produtor e o resultado da atividade no fim do ano.
É importante a elaboração da orçamentação forrageira no começo de cada ano e ir adequando-a ao longo dos meses.
O consórcio entre gramíneas e leguminosas tem crescido no Brasil, puxado pelo aumento dos preços dos fertilizantes nitrogenados.
Plantas leguminosas realizam a fixação biológica de nitrogênio (FBN), por meio da associação (simbiose) entre bactérias nitrificantes e suas raízes. O nitrogênio presente no ar é capturado e transformado pela bactéria numa forma que a planta consegue absorver.
O sistema solo/planta/animal é beneficiado com os processos de ciclagem nutricional. A leguminosa disponibiliza o nitrogênio fixado, principalmente, via liteira (material morto que se decompõe sobre o solo). Com uma relação C:N de decomposição rápida, ou seja, relação baixa (<20:1), o nutriente permanece no solo e retorna para o sistema.
Com a FBN, é possível diminuir o nível de adubação nitrogenada para a espécie gramínea.
O fertilizante nitrogenado mais utilizado é a ureia agrícola, com teor de N em 45%. Considerando que sua tonelada seja de R$ 4.930,00, a tonelada exclusiva do nutriente (N) seria de R$ 10.955,55. Dessa forma, em uma estimativa de que o consórcio de leguminosas pode fixar entre 40 e 140 kg por hectare por ano de N, a economia gerada ficaria entre R$ 391,07 e R$ 782,14 por hectare por ano.
Apesar da diminuição do uso de fertilizantes nitrogenados, é importante lembrar que a adubação da área ainda é necessária, a fim de obter melhores resultados.
Além de auxiliar no fornecimento de nitrogênio, as leguminosas promovem a diversificação do sistema e a redução de risco de pragas e doenças e diminuição, por meio da competição, da ocorrência de plantas invasoras.
A utilização de leguminosas ainda representa um ganho no valor nutritivo (digestibilidade, consumo e eficiência energética), quando comparado às gramíneas tropicais.
A digestibilidade de leguminosas de clima tropical e temperado variam entre 55% e 60%; enquanto teor de proteína bruta, entre 16,5% e 17,5%. Já para gramíneas de clima tropical e temperado, a variação é de 54% a 67% e 9% a 12%, para digestibilidade e teor de proteína bruta, respectivamente.
Porém, mesmo apresentando diversos aspectos positivos, o consórcio exige maiores cuidados com o manejo.
Alguns cuidados devem ser tomados, como:
A proporção da leguminosa no plantel também pode impactar o desenvolvimento da gramínea, podendo gerar competição interespecífica por luz, nutrientes e água, diminuindo a produção da gramínea.
É indicado que entre 40% e 60% da área seja composta por gramíneas, a fim de obter ótima realização do consórcio.
O Brasil já apresenta sistemas de integração bastante consolidados em outras culturas, como a cana-de-açúcar, que vê na MEIOSI uma integração benéfica para fornecimento de N, seja utilizando culturas tradicionais como o amendoim, a soja ou até culturas sem valor agregado, como a Crotalaria.
Já para pastagens, a diversidade de utilização está na quantidade de leguminosas perenes de verão e inverno, sendo os gêneros Stylosanthes e Arachis (amendoim forrageiro) os mais conhecidos, com reconhecimento para Leucaena, Pueraria, Colopogonium, Glycine (soja perene), Cajanus cajan (feijão guandu), crotalárias e Mucuna. Para o inverno, a rainha das forrageiras é a alfafa (Medicago sativa L.) e alguns trevos do gênero Trifolium.
A orçamentação forrageira é fundamental para a saúde da atividade pecuária e, para o produtor que realiza o ciclo completo (cria, recria e engorda), tem papel importante na determinação e estabelecimento da estação de monta da propriedade. Assim, tem-se a perspectiva de quantidade de animais a pasto durante a fase de maior disponibilidade de nutrientes do pasto.
A estação de monta (EM) é uma técnica que auxilia no processo de fertilização das matrizes, garantindo que todos os bezerros nasçam em uma janela de tempo menor, prática que viabiliza o manejo desses animais.
Para implementação adequada e bem estruturada na propriedade, a primeira coisa a ser feita é saber as condições climáticas na região e qual a disponibilidade de pastagens ao longo do ano.
A estação de monta é fundamental por possibilitar a união entre a época em que a vaca e o bezerro aumentam sua demanda por nutrientes com o período de maior disponibilidade de nutrientes nas pastagens, em função do período das águas.
O estabelecimento da estação de monta traz diversos benefícios ao rebanho de cria, como diminuição da taxa de mortalidade e aumento da taxa de natalidade e da taxa de lotação, e tudo isso sem causar problemas na eficiência produtiva.
Esses benefícios viabilizam, consequentemente, o manejo da propriedade, além de possibilitar o retorno mais cedo do escore corporal adequado das matrizes à entrada do período reprodutivo.
Novilhas (nulíparas) e vacas de primeira (primíparas), segunda e terceira (multíparas) parição são usadas para cria.
A fertilidade de nulíparas tende a ser menor, pois ainda não chegaram em sua completa evolução hormonal, mas, com a EM e a utilização de IATF (Inseminação Artificial em Tempo Fixo), a taxa de prenhez aumenta, possibilitando maior rentabilidade ao produtor.
Na estação de monta, há vários métodos para obter melhor desempenho na taxa de prenhez: monta natural, Inseminação Artificial (IA), Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF).
Na monta natural, costuma-se usar uma relação de 20 a 40 vacas por touro.
A Inseminação Artificial, em Tempo Fixo ou não, traz melhores e maiores benefícios ao produtor, entre eles a padronização dos lotes e ganho genético. No primeiro, o cio é detectado e a fêmea é inseminada. No segundo, há uma sincronização de cio no rebanho por meio do uso de hormônios.
Quando a estação de monta está sendo implementada, as matrizes são divididas em duas categorias na propriedade: vacas vazias e vacas com bezerro ao pé. Para cada uma, os eventos são distintos:
Figura 3.
Escores de condição corporal (ECC) para vacas leiteirasFonte: Engormix (2008)
Embrapa Pecuária de Corte
Scot Consultoria
ATHAYDE, A. A. R. Persistência e qualidade do consórcio de leguminosas com coastcross. Lavras: UFLA, 2010. Tese – Universidade Federal de Lavras, 2010. Orientador: Antônio Ricardo Evangelista.
BARBERO, R. P. et al. Production potential of beef cattle in tropical pastures: a review. Ciência Animal Brasileira, v. 22, 2021. https://doi.org/10.1590/1809-6891v22e-69609
DIEHL, M. S. et al. Produtividade de sistemas forrageiros consorciados com leguminosas. v. 65, n. 5, p. 1527-1536, 2013.
FLORIO, A. Efeitos da proporção gramínea-leguminosa e densidade de plantas no estabelecimento de pastos mistos em solos de Cerrado. 1983. Dissertação (Mestrado em Nutrição Animal e Pastagens) − Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 1983. doi:10.11606/D.11.1983.tde-20220207-170224
LABORATÓRIO DE PROCESSAMENTO DE IMAGENS E GEOPROCESSAMENTO (LAPIG). Atlas das pastagens. Disponível em: https://atlasdaspastagens.ufg.br/map. Acesso em: 20/10/2022.
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