Blog •  29/10/2019

Transição de período seca x água: cuidados e impactos nas pastagens

Autor:  Adilson de Paula Almeida Aguiar, zootecnista
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Transição de período seca x água: cuidados e impactos nas pastagens

O período das águas está começando. Confira o passo a passo para se fazer na transição de período seca x água

Quando se trata de manejo da pastagem e de planejamento alimentar em sistemas de pastejo, considerando as dimensões continentais do Brasil e sua diversidade climática, é importante a caracterização dessa diversidade para melhor compreensão do que será abordado neste artigo.

Primeiro, existem dois tipos climáticos principais no Brasil: o tropical, acima do Trópico de Capricórnio; e o subtropical, abaixo desse paralelo, que está no hemisfério sul da Terra, na latitude de 23º26’14” sul.

Acima do Trópico de Capricórnio, na região tropical do país, para fins de planejamento alimentar, divide-se o ano em duas estações: de seca e de chuva. Por outro lado, abaixo do paralelo, para os mesmos fins, divide-se o ano nas estações do ano: primavera-verão e outono-inverno.

Do território brasileiro, 92% encontra-se no hemisfério sul, 93% na zona tropical e, neste artigo, vamos trabalhar na região tropical do país, que é a mais representativa para a pecuária nacional, principalmente a de corte.

Considerando apenas a região tropical, ainda é preciso fazer outra classificação: a maior parte das áreas dentro dela têm seu período chuvoso nas estações de primavera (22 de setembro a 21 de dezembro) e verão (21 de dezembro a 22 de março).

Entretanto, acima da linha do equador, já no hemisfério norte, e na faixa litorânea de parte da Bahia (mais ao norte deste estado) e dos outros estados nordestinos, o período chuvoso ocorre do fim do verão até o fim do inverno, entre março e setembro.

Neste artigo, vamos abordar a região tropical do país, onde o período chuvoso ocorre nas estações de primavera-verão, ou seja, entre setembro e março.

Posto isso, é preciso enfatizar que a primavera, nessa região onde vamos trabalhar, é a estação mais favorável para a produção vegetal e animal.

Primeiro porque é a estação em que o fotoperíodo, ou seja, o tempo de exposição à luz que as plantas recebem a cada dia, aumenta até 21 de dezembro. Além disso, a temperatura está em ascensão e começam as chuvas.

Com isso, ocorre a incorporação de nitrogênio e enxofre ao solo, provenientes da atmosfera, e começa a decomposição de material orgânico da terra, o que favorece uma “explosão” de crescimento da pastagem, se ela estiver bem manejada.

Sob o ponto de vista do componente animal, é a estação em que a taxa de fertilidade de fêmeas e machos em reprodução é superior e que o desempenho individual é maior em todas as categorias animais do rebanho.

Por outro lado, esse período é o mais crítico dentro de uma perspectiva de planejamento alimentar em sistemas em pasto, principalmente quando o manejo da pastagem vem acumulando erros desde a estação chuvosa anterior.

Algumas ocorrências que impõem desafios ao pecuarista e sua equipe de funcionários e torna o planejamento alimentar mais complexo nesse período são:

  1. Em fazendas onde a pastagem foi superpastejada (taxa de lotação acima da capacidade de suporte da pastagem), com o início das primeiras chuvas, vem uma rebrota composta por folhas tenras, com baixo conteúdo de matéria seca e de fibra, com alta digestibilidade, que passa rapidamente pelo trato digestivo do animal, provocando diarreias. Já sob o ponto de vista da planta forrageira, ela é consumida com alta intensidade e alta frequência, o que leva ao esgotamento de suas reservas e possível degradação do estande de plantas. Sob o ponto de vista do solo, ele pode ficar adensado, levando à compactação e à possível erosão. Com esses erros acumulados, a pastagem deixa espaços que são dominados por plantas daninhas. Aquela planta forrageira tenra é mais susceptível ao déficit hídrico ocorrido durante as estiagens (veranicos) como também a pragas cortadoras (formigas, lagartas, etc.).

     

  2. Já em fazendas onde a pastagem foi subpastejada (taxa de lotação abaixo da capacidade de suporte da pastagem) desde a estação chuvosa anterior, e, com a chegada das chuvas, aquela alta massa de forragem que sobrou está seca e os tecidos da planta mortos. Com as primeiras chuvas, as folhas secas e mortas se desprendem dos perfilhos e caem no solo. Na planta, ficam os caules com perfilhos aéreos, comprometendo a estrutura do pasto, com touceiras altas e muitos talos, circundados por plantas baixas que vêm sendo superpastejadas. As plantas altas e o excesso de palha sobre o solo retardam a rebrota inicial da pastagem por sombreamento das gemas basais e pela imobilização de nutrientes na decomposição da grande quantidade de palha (nitrogênio, fósforo e enxofre). Por outro lado, a espessa camada de palha cria um ambiente favorável para a sobrevivência e proliferação de pragas, particularmente cigarrinhas que atacam pastagens, e de fungos que podem causar distúrbios nos animais. Além disso, a espessa camada de palha tem sido uma das causas da morte de plantas forrageira em muitas regiões do país.

Essas duas condições de pressão de pastejo não serão resolvidas facilmente nessa transição seca-chuva 2019-2020.

Portanto, a orientação é que o pecuarista e sua equipe se prepararem para manejar bem a pastagem na próxima estação chuvosa para não cometer os erros do passado e chegar ao período de transição seca-chuva 2020-2021 em melhores condições.

Mas vamos aos nove passos que o pecuarista deve seguir para estar preparado para o período de transição 2019-2020:

1. Para aqueles que vão estabelecer pastagens, é recomendado que as espécies e os cultivares forrageiros que serão plantados já tenham sido escolhidos e que as sementes já estejam armazenadas na fazenda. É fundamental que a análise do valor cultural dessas sementes já tenha sido feita em laboratório independente e comparada com a garantia da empresa para evitar surpresas desagradáveis e dissabores. Outros pontos importantes no planejamento são: que a taxa de semeadura já esteja calculada; que as máquinas, implementos e veículos que irão trabalhar no estabelecimento da pastagem já tenham sido revisados; que a equipe que irá executar já tenha sido treinada; que o solo já esteja preparado, no caso de preparo convencional, ou que já esteja tudo preparado para a dessecação da vegetação para plantio direto (plantio na palha).

2. A infraestrutura de suporte ao manejo da pastagem (módulos de pastoreio, cercas, aguadas, cochos, etc.) deve estar pronta ou com sua manutenção em dia para aproveitar ao máximo o melhor período de produção animal em pasto.

3. Se houve erros no manejo do pastejo, provocados pelo subpastejo, e o pasto está com sua estrutura comprometida, desuniforme, entouceirado, com muitos talos nas touceiras, e com perfilhos aéreos nesses talos, o pecuarista deve estar preparado para roçar o pasto e acertar sua estrutura. A primavera, de outubro a dezembro, na região tropical, é a melhor estação para roçar pastos.

4. Para o controle de plantas daninhas, por pulverização foliar, a primavera chuvosa é a melhor estação para a pastagem responder com vigor à eliminação da competição por fatores de crescimento, luz, dióxido de carbono, água, nutrientes e espaço. Assim, o pecuarista deve estar preparado, com herbicidas comprados e já armazenados na fazenda, máquinas revisadas, pulverizador regulado e equipe treinada.

5. Para o controle de pragas da pastagem, principalmente cigarrinhas e lagartas, que são as que mais atacam na estação chuvosa, uma equipe de campo treinada para tal fim deve estar preparada para, com certa frequência, monitorar o surgimento dessas pragas para que o controle seja feito antes que a população alcance o nível de dano econômico.

6. Se o pecuarista vai adubar pastagens, espera-se que os corretivos (calcário e gesso) já tenham sido aplicados desde o final da estação chuvosa anterior para que já tenham reagido no solo, que os adubos já estejam comprados e armazenados na fazenda, que as doses de adubos que serão aplicadas tenham sido quantificadas com base em metas específicas e com análise de viabilidade técnica e econômica, etc. Do contrário, é preciso reavaliar o programa e talvez tomar a decisão de deixar para o ano seguinte.

Leia também: Calagem: uso de calcário nas pastagens e no mercado

7. Para pecuaristas que irrigam pastagens, tudo deve estar preparado para maximizar a produtividade na estação de primavera, que apresenta as melhores condições ambientais para a máxima resposta da pastagem a essa tecnologia.

8. Em um programa de suplementação animal em pasto bem elaborado, o ano é dividido em quatro períodos: transição seca-chuva, chuvas, transição chuva-seca e seca. Em cada um desses períodos, deve haver mudanças no programa, no tipo de suplemento, na sua quantidade e na sua composição, de acordo com a qualidade e a disponibilidade da forragem, como também nas metas de desempenho de cada categoria animal do rebanho. No período de transição seca-chuva, quando na maioria das fazendas os animais perdem condição corporal por causa das diarreias, hoje existem aditivos que, incluídos nos suplementos, previnem esse quadro, minimizando seu impacto sobre o desempenho animal.

9. Fazendas que exploram pastagens intensivamente no período chuvoso e que não têm sistemas de irrigação devem planejar a produção de volumosos suplementares para suplementar o rebanho, principalmente no período de transição seca-chuva. A suplementação dos animais que voltarão para as pastagens após esse período de transição tem sido denominada por “sequestro” e tem sido usada em fazendas de cria e de ciclo completo, principalmente para os animais que foram desmamados na seca e para bezerras que serão desafiadas como superprecoces e novilhas prenhes que irão parir nesse período e serão as primíparas na próxima estação reprodutiva. Por outro lado, em fazendas de recria e engorda, o sequestro tem sido usado como estratégia para repor animais mais facilmente e com menor custo de ágio ainda no período da seca. O sequestro de animais também tem sido usado como uma poderosa ferramenta para o manejo da pastagem nesse período de transição.

É importante ressaltar o fato de que em uma mesma estação, em um mesmo período, o acúmulo de atividades é grande, sem considerar que ainda existe a campanha de vacinação contra a febre aftosa em novembro, além de possíveis imprevistos. Nesse contexto, recomenda-se que:

  • Haja um planejamento de curto, médio e longo prazo, que deve ser elaborado com base em um inventário prévio, o qual deu suporte a um diagnóstico e a um plano de metas.
  • No planejamento de curto prazo, nesse caso específico, apenas no período de transição seca-chuvas, é preciso que todas as ações, tarefas e procedimentos estejam em um calendário, de preferência impresso, afixado em um local visível para toda a equipe. E que ele tenha sido discutido exaustivamente com a equipe que irá executar.
  • A execução de cada ação, tarefa ou procedimento tenha sido avaliada sob as seguintes perspectivas: por que, onde, quando, por quem, quanto e como.

Essa sequência impedirá que haja “encavalamento” na execução e permitirá que se aproveite ao máximo as condições favoráveis do período de transição seca-chuva.

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Autor: Adilson de Paula Almeida Aguiar, zootecnista, professor de Forragicultura e Nutrição Animal no curso de Agronomia, de Forragicultura e Pastagens e Plantas Forrageiras no curso de Zootecnia nas Faculdades Associadas de Uberaba (FAZU); consultor associado da CONSUPEC – Consultoria e Planejamento Pecuário Ltda.; investidor nas atividades de pecuária de corte e de leite.